Preparamos um cartaz juntando imagem e texto de nossos antepassados, cristalizando a maneira como as gerações anteriores de anarquistas enxergavam a relação entre a resistência à ordem existente e a construção de alternativas à ela. Abaixo traçamos a história de cada elementos do cartaz.
“Nos deixe então confiar no Espírito eterno que destrói e aniquila apenas por que é a fonte intangível e eternamente criativa de toda a vida. A paixão pela destruição é, também, uma paixão criativa.”
-Mikhail Bakunin, “A Reação na Alemanha,” Deutsche Jahrbücher fur Wissenschaft and Kunst, nos. 247–51
Clique na imagem para baixar o poster.
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A Ilustração
Essa ilustração apareceu originalmente em 2001, no auge da atividade anticapitalista conhecida também como “O movimento antiglobalização,” em um albúm 7 polegadas da banda punk anarquista Dinamarquesa, Paragraf 119. O nome da banda faz referência ao artigo da lei Dinamarquesa que proíbe ferir oficiais do governo (“Se um policial quiser pagar com sua vida — tudo bem por nós”), Paragraf 119 surgiu dos movimentos punk, okupa e anarquista de Copenhagem nos anos 1990, reunido em torno do histórico centro social ocupado Ungdomshuset. Em outro albúm do Paragraf 119, as fotos de vários dos membros da banda os mostram sendo presos em alguma violação da “ordem pública”. Isso é o melhor do punk — não como um gênero musical, mas como uma cultura de resistência na qual músicas extraem sua força das atividades compartilhadas entre artistas e ouvintes, os quais, através de seu esforço coletivo, geraram um espaço onde esses hinos tinham sentido real.
A capa do vinil 7” do Paragraf 119 onde o poster apareceu originalmente.
Se lembre deles, cada um deles, até o dia que a gente revidar
Se lembre de cada espancamento, se lembre de cada ativista preso
Se lembre dos camaradas feridos, cada anarquista assassinado
Se lembre das acusações forjadas, se lembre de cada ferimento
Se lembre de cada ato de injustiça cometidos por aqueles no poder
Nada esquecido, nada perdoado-Paragraf 119, “Intet Glemt, Intet Tilgivet” (“Nothing forgotten, nothing forgiven”) no albúm “Musik til Ulempe” 7”
O Texto
Até onde podemos afirmar, o mote “a vida é uma relação empolgante entre a destruição e a criação” apareceu pela primeira vez na capa da quinta edição do periódico anarquista Live Wild or Die! (Viva Livre ou Morra!) por volta de 1994 em Berkeley, Califórnia.
Em conjunto com Do or Die (e mais tarde, Disorderly Conduct), o periódico Live Wild or Die! ofereceu os elementos mais radicais e inegociáveis do movimento ecológico em uma era antes de que a maioria dos participantes tivesse acesso consistente à internet. Você pode encontrar os primeiros três números aqui.
Da capa de Live Wild or Die! #5.
Finalmente, o texto menor no cartaz foi extraído da famosa entrevista com o anarquista espanhol Buenaventura Durruti que apareceu no Toronto Daily Star em 5 de agosto de 1936. Essa entrevista segue relevante hoje, quando a mais recente administração a tomar o poder nos Estados Unidos se apresenta como uma oposição ao fascismo enquanto segue priorizando reprimir anarquistas e demais antifascistas:
“As massas estão armadas. O exército não conta mais. Existem dois campos: os civis que lutam pela liberdade e os civis que são rebeldes e Fascistas. Todos os trabalhadores na Espanha sabem que se o fascismo triunfa, haverá fome e escravidão. Mas os Fascistas também o que está reservado para eles quando forem derrotados. É por isso que a luta é tão implacável e contínua. Para nós é uma questão de destruir o fascismo, exterminando seu rastro e o varrendo para longe para que nunca possa voltar sua cabeça para a Espanha outra vez. Nós estamos determinados em acabar com o fascismo de uma vez por todas. Sim, e apesar do governo.
“Porquê você fala ‘apesar do governo’? Não é o governo que está lutado contra a rebelião fascista?” Eu perguntei com certa surpresa.
“Nenhum governo no mundo combate o fascismo até sua morte. Quando a burguesia vê o poder escapando de suas mãos, tem recorrido ao fascismo para se manter. O governo Liberal da Espanha poderia ter deixado os elementos Fascistas sem poder há muito tempo atrás”, continuou Durruti. “Ao invés disso, temporizou e comprometeu e errou. Mesmo agora, nesse momento, homens do governo querem pegar leve com os rebeldes. Você nunca pode dizer que sabe”, ele riu, “o governo atual ainda pode precisar dessas forças rebeldes para esmagar o movimento dos trabalhadores.”
[…]
“Vocês podem vencer sozinhos?” Eu fiz a pergunta que não quer calar à queima-roupa.
Durruti não respondeu. Ele coçou seu queixo. Seus olhos brilharam.
“Vocês vão estar sentados numa montanha de ruínas mesmo que sejam vitoriosos” Eu arrisquei, para quebrar seu devaneio.
“Nós sempre vivemos em favelas e buracos nas paredes,” ele disse calmamente. “Nós saberemos como nos acomodar por um tempo. Pois, você não deve esquecer, nós também podemos construir esses palácios e cidades, aqui na Espanha e na América e em todo lugar. Nós, os trabalhadores. Nós podemos construir outros para tomar o lugar desses. E melhores. Nós não temos medo de ruínas. Nós vamos herdar a terra. Não há a menor dúvida quanto a isso. A burguesia pode destruir e arruinar seu próprio mundo antes de deixar o palco da história. Nós carregamos um novo mundo aqui, em nossos corações,” ele falou em um sussurro rouco. E adicionou: “Esse mundo está crescendo em nós nesse minuto.”
-“Durruti: O Povo Armado”, Abel Paz
Durante grande parte do século 20, o movimento global de ocupações foi uma das principais linhas de transmissão através da qual o anarquismo era passado de uma geração para a outra, literalmente subsistindo nas ruínas. Se as ideias anarquistas estão se espalhando para as novas gerações de hoje é, em parte, graças aos esforços das gerações de okupas e eco-sabotadoras à quem dedicamos esse cartaz.